
Com informações da ONU
O conflito no Sudão, iniciado em abril de 2023 entre o Exército sudanês e as Forças de Apoio Rápido (RSF), já é considerado uma das maiores crises humanitárias do mundo. Mais de 30 milhões de pessoas precisam de assistência, segundo a ONU. Em meio ao avanço da fome, surtos de cólera e bloqueios sistemáticos à ajuda humanitária, crianças e civis pagam o preço mais alto.
El Fasher sob cerco há 500 dias
A cidade de El Fasher, capital de Darfur do Norte, tornou-se o epicentro da violência. Há mais de 500 dias, está sob cerco das RSF, que impediram a entrada de alimentos, medicamentos e água potável.
Relatórios da ONU apontam bombardeios quase diários, incursões contra campos de deslocados internos e execuções sumárias. Desde agosto, ao menos 125 civis foram mortos, mas os números reais podem ser muito maiores.
No campo de Abu Shouk, vizinho à cidade, a situação é ainda mais dramática. Em dezembro de 2024, a ONU já havia identificado condições de fome extrema. Hoje, estima-se que 260 mil civis, entre eles 130 mil crianças, estejam presos em condições desesperadoras, sem acesso regular a ajuda humanitária.
Crianças em risco extremo
De acordo com o UNICEF, mais de 1.100 graves violações contra crianças foram registradas em El Fasher desde maio de 2024, incluindo assassinatos, mutilações, estupros, abusos sexuais e recrutamento forçado por grupos armados. Somente no último mês, sete crianças morreram em um ataque ao campo de deslocados de Abu Shouk.
A agência também alerta para o colapso do atendimento médico: 6 mil crianças em estado de desnutrição aguda severa estão sem tratamento por falta de suprimentos. Sem alimentos terapêuticos e cuidados básicos, o risco de morte é altíssimo.
“Estamos diante de uma tragédia devastadora – crianças em El Fasher estão morrendo de fome enquanto nossos serviços de nutrição são bloqueados”, afirmou Catherine Russell, diretora executiva do UNICEF.
A crise alimentar se soma a outro inimigo mortal: a cólera. O país enfrenta o pior surto da doença em décadas, com mais de 2.400 mortes registradas desde julho de 2024. Nos campos superlotados de Tawila, Zamzam e El Fasher, crianças enfraquecidas pela fome estão particularmente vulneráveis a doenças transmitidas pela água contaminada.
Uma nação em ruínas
A guerra transformou o Sudão, antes conhecido como o “celeiro do Chifre da África”, em um país à beira do colapso. A temporada de escassez atual deixou 680 mil pessoas em situação de insegurança alimentar catastrófica.
Cartum, a capital, hoje é descrita como uma “cidade fantasma”, com ruas cobertas por destroços de guerra e um “trauma palpável em toda parte”, segundo relatos da ONU.
Enquanto isso, comboios humanitários ficam bloqueados. Mais de 70 caminhões carregados com alimentos, vacinas e kits médicos aguardam liberação em Nyala, Darfur do Sul. “O que precisamos é de apenas 55 centavos por pessoa, por dia. Só isso para o Sudão”, disse Edem Wosornu, diretora de Operações e Advocacy do OCHA.
Apelos por paz e acesso humanitário
O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse estar “horrorizado com os ataques implacáveis” das RSF contra civis em El Fasher e pediu cessar-fogo imediato.
“O sofrimento humano no Sudão só terá fim com a paz”, afirmou seu porta-voz, Stéphane Dujarric. “Mas até que as armas se calem, é urgente permitir o acesso seguro e sustentado da ajuda.”
Sem cessar-fogo, ajuda humanitária e negociação política inclusiva, a guerra tende a se prolongar deixando milhões de sudaneses presos entre a fome, a epidemias e a violência.