Alexandre Costa Nascimento, Por dentro da África
Lisboa – O aparente abismo existente entre o mundo acadêmico e a chamada linha de frente dos movimentos ativistas que atuam na África tende a diminuir na mesma proporção do esforço intelectual que ambos os lados fizerem para desmontar estruturas antigas de pensamento que limitam a concretização dos seus objetivos. O processo não é fácil, mas é urgente, na avaliação do ativista da Guiné-Equatorial Juan Tomás Ávila Laurel, que participou nesta quinta-feira (12) da mesa de abertura da Conferência Internacional Ativismos em África, em Lisboa.
“O ativismo é algo que se pode fazer de maneira física, presencial. Mas ninguém pode semear em um campo que não se limpou. Portanto, é impossível fazer ativismo em moldes que não correspondem ao que queremos conseguir. Devemos fazer primeiro um ativismo intelectual para desmontar estruturas antigas e coloniais, especialmente”, afirma.
Militante na defesa da Democracia e dos Direitos Humanos, e vivendo há duas décadas exilado de seu país por seu crítico do governo de Teodoro Obiang, Tomás Ávila afirma que conceitos como “unidade nacional” e a “fé” são heranças coloniais que vêm sendo instrumentalizadas por governos autoritários para submeter os povos africanos.
“Porque os africanos querem avançar com estruturas que não os pertencem ou que não funcionam para eles?”, questiona. Ele cita como exemplo o conceito de unidade nacional, que é repetido como um mantra por governos autoritários ou ditatoriais. “Não estou pedindo a destruição destas construções, mas, durante muito tempo, muitas pessoas morreram porque atentavam contra este conceito. Não pode ser que uma construção colonial criada para submeter o povo africano seja invocada ainda hoje com os mesmos objetivos”, avalia.
O ativista aponta ainda a instrumentalização da fé da população e afirma que os ativistas deveriam tomar nota de que a fé que se pratica na África deve ser submetida a escrutínio. “Nos países que vivem sob ditadura, quando há celebrações religiosas, a família do poder está sempre na primeira fila. Em países como o nosso, os padres e pastores têm condutas condenáveis conhecidas pelos cidadãos e estas igrejas também tomam parte na ditadura”, aponta.
Segundo ele, o espaço das igrejas é um espaço que os ativistas têm que disputar politicamente. “Deve ser um dos objetivos das pessoas que lutam pela liberdade em África. Se a gente crê que as igrejas devem ser libertadas, colocaremos a primeira pedra para libertar essa gente”.
Tomás Ávila avalia que não se pode existir conceitos absolutos que são constantemente invocados por políticos em um esforço de perpetuação no poder. “Não pode ser algo sagrado e que nos leve à morte”, conclui.
Painéis
Mais de 40 trabalhos acadêmicos abordando as diversas perspectivas do ativismo no continente africano foram apresentados nesta quinta-feira (12), em Lisboa, durante o segundo dia da Conferência Ativismos em África.
O encontro reuniu pesquisadores e especialistas de instituições africanas, europeias e das Américas, que durante os painéis apresentaram os resultados de suas pesquisas em temas como neo-colonialismo, direitos humanos, educação, liberdade de imprensa, direitos LGBT, democracia, empoderamento feminino, acesso à terra, entre outros.
Nesta sexta-feira, último dia da conferência, outros 50 trabalhos serão apresentados ao longo do dia na sede do Instituto Universitário de Lisboa.
Serviço
Conferência Internacional Ativismos em África
Data: 11 a 13 de janeiro.
Local: Iscte-IUL – Av. das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal.
Evento é gratuito e aberto a toda a comunidade interessada.
A programação completa está disponível no site da organização do evento