Por Susan de Oliveira, Por dentro da África
Há um ano, os ativistas angolanos condenados no conhecido processo dos 15+2, estão presos. Todo o julgamento ocorreu sem que lhes fosse concedida a liberdade provisória, desde o dia em que foram detidos, em 20 de junho de 2015. A condenação se fez acompanhar de uma dura sentença que estabeleceu a prisão efetiva em regime fechado entre 2 a 8 anos e meio de prisão em função de uma acusação que não estava nos autos: A de associação de malfeitores.
Devido a essa acusação extemporânea que não deu chance à preparação da defesa e que redefiniu o teor da sentença e a pena, coube aos advogados lançarem mão do direito ao recurso pela inconstitucionalidade do julgamento baseando-se na jurisprudência existente para que os ativistas permanecessem na situação em que estavam, ou seja, 15 deles em prisão domiciliar e as duas mulheres, Laurinda Gouveia e Rosa Conde, em liberdade. Este recurso apresentado ao Juiz do caso, Januário Domingos, não foi aceito por ele.
Nem poderia. Caberia, no entanto, segundo a Lei angolana, que fosse encaminhado ao Tribunal Supremo, o que não foi feito no prazo das 48 horas seguintes ao seu recebimento.
A demora no encaminhamento do recurso fez com que até hoje, quase três meses após a condenação, ainda o Tribunal Supremo não o tenha julgado. Para averiguar a situação, as esposas e mães dos ativistas, como representantes das famílias, há uma semana estiveram às portas do Tribunal na tentativa de serem recebidas para uma audiência onde uma pergunta simples mereceria uma resposta objetiva: para quando será o julgamento do recurso?
A resposta que veio não foi objetiva, porém muito grave: O recurso sequer chegou ao Tribunal Supremo. Em uma carta divulgada nesse domingo, 19, véspera de completar um ano da prisão, os ativistas escreveram uma carta, assinada por 12 deles, notadamente os que cumprem pena no Hospital-Prisão São Paulo, em Luanda, dirigida ao diretor dos Serviços Penitenciários, António Fortunato, solicitando que seja “acautelado” o transporte dos reclusos ao Tribunal Supremo no dia 5 de julho, pelas 9h, “caso não haja pronunciamento favorável” ao referido pedido de habeas corpus interposto pelos advogados, até à tarde do dia 4 de julho.
Diretor Nacional dos Serviços Penitenciários, Exmo Sr. António Fortunato
Luanda Angola.
Há 366 dias, isto é, um ano, o regime do ditador José Eduardo dos Santos, mandou-nos aos seus calabouços sob a acusação quixotesca e pidesca de que estávamos a preparar atos tendentes a alterar a ordem pública e atentar contra o Presidente da República!
Em 2015 os angolanos já sentiam os efeitos de uma crise económica-financeira que expôs não apenas a selvagem depredação do erário público como também o facto de que Angola nunca foi governada à luz de um projeto político-filosófico de Nação.
O país continua a ser (des)governado sob a lógica do improviso, do paliativismo e da exclusão do outro. A crise que agora atravessamos é demostração assaz evidente da grave crise de Estado, embasada na rutura do contrato social que era suposto ser respeitado pelos governantes Nepotismo, Cleptocracia, Corrupção, Clientelismo, Despesismo, Megalomania, Pseudo-desenvolvimento, Violação da Constituição e da lei, Pseudo-reconciliação, Falsificação da História… Ditadura!
O nosso caso é exemplo flagrante da confluência desses elementos, da decrepitude de um regime autoritário que, na encruzalhada de uma transição que tem sido incapaz de concretizar-se vê na contigência de se fingir democrático. A decisão de nos devolver à austeridade de um estabelecimento prisional é, mais do que um ato de prepotência, manifestremente ILEGAL, uma vez que a mesma não entra em vigor até que seja confirmada por uma instância superior, no caso o Tribunal Supremo. Isto, por sua vez, implica que os réus devem aguardar essa confirmação na condição em que se encontravam antes do veredito de primeira instância a saber: Prisão domiciliária para os 15, Liberdade para as 2.
Estamos portanto perante um inqualificável abuso de poder protagonizado pelo incompetente juíz Januário Domingos, agindo por encomenda do poder político, de José Eduardo Dos Santos, para ser mais específico. O erro torna-se mais vergonhoso e a promiscuidade de poderes mais evidente quando, três (3) meses depois, não se tenha ainda reposta esta minúscula legalidade num universo de pontapés nas rótulas á senhora verdade que enfermam este processo.
Se pretendemos que Angola, se torne brevemente num Estado verdadeiramente democrático e de direito não podemos de maneira nenhuma tolerar que os direitos e Liberdades fundamentais se subordinem aos caprichos arbitrários de quem se coloca acima da lei. Esse motivo nós, os 12 ativistas do processo dos 17, internados no HPSP, decidimos que o benefício da divida concedido à justiça angolana não tem mais razão de ser, expirar.
Servimo-nos desta para comunicar ao Sr. Diretor Nacional a nossa pretensão de deslocar-_nos nós, próprios ao Tribunal Supremo para exigir que reponham a legalidade e que seja observado sem mais delongas e bazofias legalistas o efeito suspensivo.
Solicitamos portanto que seja acautelado o serviço de escolta dos Serviços Penitenciários para acompanhar-nos ao Tribunal Supremo no dia cinco (5) de Julho pelas 9h0, caso não haja pronunciamento favorável acerca do pedido de Habeas Corpus interposto pelos nossos advogados a 1 de Abril de 2016 até a tarde de 4 de Julho.
Cientes de que a nossa petição receberá o devido tratamento da sua parte e sem outro assunto a abordar de momento nos subcrevemos.
Respeitosamente,
Arante Kivuvu
José Gomes Hata
Inocêncio de Brito
Hitler Samussuku
Benedito Jeremias Dali (Dito)
Nelson Dibango Santos
Fernando Antonio Thomas
Afonso M’banza Hamza
Manuel Chivonde NitoAlves
Nuno Alvaro Dala
Albano Bingu
Luaty Beirão.
Luanda, aos 19 de Junho de 2016.