Por Susan de Oliveira, Por dentro da África
O julgamento dos 15+2 ativistas, que iniciou no dia 16 de novembro, com duração prevista até o dia 20 do mesmo mês, já está na quarta semana prolongando a impressionante farsa de uma acusação por crimes de “atos preparatórios de rebelião” ou o que o valha a esta altura da interminável arguição e apresentação de fragmentos de conversas, diálogos confusos e descontextualizados, as ditas “provas” grosseiramente manipuladas pelos juízes e conseguidas ilegalmente por um espião do governo com o intuito de incriminar os réus a qualquer custo.
Por que as manipulações e por que a tortura psicológica de um julgamento sem fim no qual se pretende com induções aleatórias extrair um indício que seja de que o circo de horrores faz algum sentido? Para quem serve este espetáculo macabro?
Os jovens ativistas protagonizam o julgamento de toda uma geração que decidiu manifestar seus descontentamentos com um Estado engessado no modus operandi da manutenção de um partido no poder que teme – sim, teme – a oposição seja ela qual for e tolera os partidos porque, afinal, são eles que dão um ar democrático ao concurso político eleitoral que serve apenas para iludir as expectativas da sociedade angolana pela simples estratégia de que a possibilidade (ainda que remota) de uma alternância de poder seja tomada com uma democracia real. De modo algum, a simples alternância de um governante ruim por outro pior, ou de um ditador por outro, ou de um modelo econômico que privilegia os ricos por outro que o continua, seria indício de mais democracia.
O inconformismo e a revolta latente que se passa hoje em Angola de igual modo passaria também se o governo fosse de outro partido, mas a situação econômica e política fosse a mesma. Ou não passaria caso o MPLA buscasse, no tempo de governo que teve até agora, a democracia real com inclusão social, liberdade de expressão, variação nos investimentos econômicos e no desenvolvimento do povo angolano.
É absolutamente transparente a falta de projeto do MPLA para a maioria da população angolana, tão diversa e tão necessitada de políticas efetivas de combate à pobreza e à exclusão social e, sobretudo, para esta geração que é a que mais sente a ineficácia histórica do governo e porque ela não aceita viver sob os chicotes de um Estado que serve à manutenção do poder autocrático estabelecido e da forma como ele tem sido conduzido para manter privilégios de uma elite que governa e enriquece sem qualquer escrúpulo.
A criminalização dos anseios de uma geração que escancara as contradições e os limites de um governo autoritário e elitista está emblematizado no julgamento dos 15+2 e isto para eles é uma vitória política definitiva também porque, além de tudo, denuncia a farsa e a manipulação do poder judiciário pela força bruta do executivo.
Nessas quatro semanas de julgamento, de torturas psicológicas, fraudes documentais e pressão sobre a opinião pública através das mídias e quadros governistas, o desgaste produzido foi imenso e, mais uma vez, também para o governo de José Eduardo dos Santos que – com o perdão pela triste metáfora – conduz o sangramento de uma geração para seu benefício próprio. Se as gerações anteriores dos revolucionários angolanos sangraram pela independência colonial e pela governabilidade do MPLA que prometia democracia, esta geração atual sangra para que a democracia não aconteça.