Autoridades de todo o mundo estarão reunidas em Marrakesh, Marrocos, neste fim de semana, antes de uma grande conferência convocada pelas Nações Unidas para adotar formalmente um acordo global extenso e inclusivo com objetivo de tornar a migração mais segura e digna para todos.
O texto do acordo, conhecido formalmente como Pacto Global para Migração Segura, Ordenada e Regular, foi aceito por Estados-membros na Assembleia Geral da ONU, em julho. O Pacto Global não vinculante é baseado em valores de soberania de Estados, compartilhamento de responsabilidade, não discriminação e direitos humanos. O acordo reconhece que uma abordagem cooperativa é necessária para aperfeiçoar os benefícios gerais da migração, enquanto também mitiga os riscos e desafios para indivíduos e comunidades em países de origem, trânsito e destino.
Com mais de 68 milhões de pessoas forçadas a se deslocar no mundo, migrantes e refugiados tomaram as manchetes nos anos recentes; da crise de refugiados na Europa às caravanas de migrantes saindo da América Central e seguindo para o sul dos Estados Unidos.
Leia, a seguir, informações importantes para a Conferência Internacional de Marrakesh, que começa na segunda-feira (10) e irá durar dois dias.
Migrantes regulares, migrantes irregulares e refugiados… Qual a diferença?
A Conferência de Marrakesh terá foco em migração. E migração regular, como colocado pela representante especial para migração internacional, Louise Arbour, “se refere às pessoas que entram ou permanecem em um país do qual não são cidadãs através de meios legais, e cujas posições neste país são obviamente conhecidas para o governo e em conformidade com todas as leis e regulamentos”. Migrantes regulares representam “a maioria esmagadora das pessoas que cruzam fronteiras”, acrescentou Arbour em entrevista ao UN News.
Já a migração irregular “é a situação de pessoas que estão em um país, mas cujos status não estão em conformidade com exigências nacionais”. Segundo a autoridade sênior da ONU para migração, a vasta maioria destas pessoas entrou legalmente no país, talvez com vistos de turismo ou estudo, e estendeu permanência. “Elas podem ser regularizadas, ou, caso contrário, precisam retornar ao país de origem”.
Refugiados, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), são pessoas que foram forçadas a fugir de seus países por conta de perseguição, guerra ou violência. Eles têm um “medo bem fundamentado de perseguição por razões de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou participação em um determinado grupo social”.
O que está em jogo para estas pessoas em movimento e suas comunidades?
Os dados mais recentes da Organização Internacional para as Migrações (OIM) indicam que até agora neste ano 3.323 pessoas morreram ou desapareceram em rotas migratórias no mundo todo, a maioria no Mar Mediterrâneo, onde milhares de pessoas, principalmente da África e da Ásia, tentam cruzar fronteiras rumo à Europa.
A migração está se tornando cada vez mais difícil, especialmente no que diz respeito à Europa. A OIM destacou um incidente, no qual um barco pesqueiro espanhol, o “Nuestra Madre Loreto”, ficou preso no mar por mais de uma semana após resgatar 12 migrantes que viajavam da Líbia em uma embarcação de borracha no início de novembro. Nenhum país da União Europeia aceitou conceder autorização para os migrantes desembarcarem, de acordo com relatos da imprensa espanhola.
Muitos países do mundo precisam de trabalhadores de fora, como a representante especial Arbour destacou: “os dados demográficos sugerem que se os países quiserem manter os padrões econômicos atuais ou até mesmo crescer, irão precisar receber estrangeiros bem treinados para cumprir demandas do mercado de trabalho”.
Como a migração pode ser regulada para que funcione para todos – tanto para países quanto para pessoas? O Pacto Global é projetado para responder isto, ao trabalhar em níveis nacional, regional e global, explicou Arbour.
“Não há dúvida de que veríamos um aumento da colheita de benefícios da migração e, de forma muito importante, uma redução de seus aspectos negativos.”
Arbour, que irá presidir a Conferência de Marrakesh, afirmou que, se o pacto for adotado, veremos “uma grande melhoria nos aspectos de desenvolvimento, no aspecto humanitário e em todos os benefícios econômicos que a migração é capaz de produzir, se for administrado de maneira cooperativa”.
O que é o Pacto Global?
O Pacto Global, aceito por Estados-membros da ONU em 13 de julho, é um documento abrangente para administrar de forma melhor a migração internacional, responder seus desafios e fortalecer direitos dos migrantes, enquanto ao mesmo tempo contribui para o desenvolvimento sustentável.
O texto do Pacto Global é profundamente enraizado na Carta das Nações Unidas e na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Arbour, que foi alta-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, descreveu o acordo como um “grande projeto de cooperação internacional daqui para frente”.
Destacando que “migração tem sido parte da experiência humana ao longo da história” e reconhecendo isso como uma fonte de prosperidade, inovação e desenvolvimento sustentável no mundo moderno globalizado, o Pacto expressa o comprometimento coletivo de Estados-membros para melhorar cooperação em migração internacional.
O Pacto claramente “reconhece que nenhum Estado pode responder à migração sozinho e sustenta sua soberania e suas obrigações sob lei internacional”. Logo, o Pacto apresenta um panorama cooperativo, que não é legalmente vinculante e que avança com comprometimentos aceitos sob os próprios Estados-membros dois anos antes, na Declaração de Nova York para Refugiados e Migrantes.
O ex-presidente mais recente da Assembleia Geral, Miroslav Lajčák, que tornou a migração uma peça-chave de sua agenda, destacou em julho que o Pacto “não encoraja migração ou busca impedi-la”, acrescentando que o pacto não é vinculante. “Ele não irá impor. E ele respeita totalmente as soberanias de Estados”.
Ele explicou que a implementação do Pacto irá mudar as marchas “de um modo reativo para um modo proativo”. Lajčák afirmou que o acordo “pode fornecer uma nova plataforma para cooperação”. “E isto pode ser um recurso na descoberta do equilíbrio certo entre os direitos de pessoas e a soberania de Estados”.
Com a ausência de diversos Estados, que sinalizaram recentemente que não irão se juntar ao Pacto, Arbour afirmou que “a maioria esmagadora dos Estados-membros da ONU apoia este projeto cooperativo”.
“Acho que suas políticas externas e o espírito de multilateralismo é afetado seriamente se eles, de certo modo, se afastarem de um documento que aceitaram há poucos meses. Então, acho que isto reflete muito mal naqueles que participaram do que foram negociações reais”, disse Arbour ao UN News.
Migração é um fenômeno humano. Por que atuar agora?
A migração humana não é um fenômeno novo. Humanos sempre se movimentaram de um lugar para outro ao longo da história. Mas o mundo tem vivido um grande aumento no número de migrantes recentemente e este número deve aumentar ainda mais por conta das mudanças climáticas, disse Arbour.
“Atualmente, 3,4% da população mundial são de migrantes. No ano 2000, eram 2,7%”, disse. “Isto é um fenômeno. Tem aumentado. Vai continuar aumentando? Quando olhamos todos os dados demográficos e outros fatores, sim, há expectativa de que veremos mais pessoas em movimento”.
O que prestar atenção durante a conferência
Em 10 de dezembro, a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) completa 70 anos e o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) irá celebrar a data realizando um evento paralelo mostrando oportunidades para negócios e setores fortalecerem e aumentarem seus esforços para a defesa dos direitos humanos.
A Conferência de Marrakesh também contará com o lançamento oficial da Migration Network, que será feito por Guterres. Este órgão irá garantir um sistema de apoio amplo e abrangente para implementação do Pacto Global, com a OIM assumindo o papel principal.
Outras agências da ONU, que têm em seu mandato algum aspecto relacionado à migração, farão parte da Migration Network. Isto inclui o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD) e o ACNUR.
Embora o ACNUR lide com refugiados, “existem frequentes sobreposições entre refugiados e migrantes e fluxos mistos de população”, disse Arbour, afirmando que “todas estas agências da ONU que possuem um interesse nesta questão irão se juntar para tentar maximizar a abordagem colaborativa”.