Relatório destaca resiliência de Cabo Verde a choques globais externos

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Ilha do Fogo, em Cabo Verde. Dos países de língua portuguesa, Cabo Verde é o único que aparece no estudo como um dos maiores níveis de resiliência para enfrentar choques globais.

Com informações da ONU

As economias africanas enfrentam desafios significativos para fortalecer sua resiliência diante de riscos sistêmicos em áreas como política, economia, energia, tecnologia e mudanças climáticas. O continente tem sido impactado por diversas crises internacionais, incluindo a pandemia de Covid-19 e a guerra na Ucrânia, que intensificaram suas vulnerabilidades estruturais, como a dependência de mercados externos, elevados níveis de endividamento público e infraestrutura deficiente.

O relatório “Desenvolvimento Econômico da África 2024: Desbloqueando o Potencial Comercial da África”, publicado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD), analisa como essas vulnerabilidades impactam o crescimento e a estabilidade do continente.

Entre os países africanos de língua portuguesa, apenas Cabo Verde é destacado como uma nação com maior capacidade de resiliência para enfrentar choques globais. Outros países com níveis mais elevados de resistência são África do Sul, Botswana, Ilhas Maurício e Marrocos.

Contudo, a conectividade deficiente representa um desafio significativo para todas as seis nações africanas lusófonas. No setor energético, Moçambique é o único país lusófono identificado com alta vulnerabilidade. No que diz respeito às mudanças climáticas, Seychelles é o único país africano de língua portuguesa classificado como altamente vulnerável, sem a apresentação de dados sobre outras áreas.

Para a UNCTAD, o fortalecimento da resiliência econômica africana requer a diversificação das economias por meio da integração em cadeias de valor de alto impacto e da melhoria das condições para negócios, especialmente para pequenas e médias empresas.

Reformas econômicas e o potencial de US$ 3,4 trilhões

A UNCTAD destaca a necessidade de ampliar o comércio intra-africano e realizar investimentos estratégicos em infraestrutura, transporte e tecnologia. Reformas econômicas estruturais e o uso eficiente de instrumentos financeiros inovadores são apontados como fundamentais para reduzir a dependência de mercados externos e fomentar redes comerciais regionais.

Com uma população predominantemente jovem, o continente africano apresenta um potencial significativo para crescimento econômico. A Área de Livre Comércio Continental Africana (AfCFTA), por exemplo, tem um valor estimado de US$ 3,4 trilhões, impulsionado pela abundância de recursos naturais e pelo dinamismo dos mercados locais.

A secretária-geral da UNCTAD, Rebeca Grynspan, enfatiza que o fortalecimento da resiliência dos países africanos deve abranger seis dimensões principais: política, economia, demografia, energia, clima e tecnologia. Entre as preocupações da agência estão o aumento dos golpes de Estado no continente, o enfraquecimento das instituições democráticas e os desafios na governança. Além disso, a dependência de combustíveis fósseis, os elevados níveis de endividamento e os fluxos migratórios também exercem forte pressão sobre a estabilidade regional.

Déficits estruturais e desafios econômicos

A vulnerabilidade econômica da África é agravada por eventos climáticos extremos, sistemas agrícolas altamente sensíveis às mudanças climáticas e uma crescente exclusão digital. Desde 1950, o continente registrou 220 das 492 tentativas de golpe de Estado ocorridas globalmente, refletindo instabilidades políticas persistentes.

Em 2023, quase metade dos países africanos apresentava uma dívida externa superior a 60% do Produto Interno Bruto (PIB). Em muitos casos, os governos gastavam mais com o serviço da dívida do que com investimentos em saúde e educação. Além disso, menos da metade da população africana tem acesso à eletricidade, o que limita o desenvolvimento industrial e tecnológico.

Apesar desses desafios, a África demonstrou crescimento econômico expressivo entre 2022 e 2023, aumentando sua atratividade para o comércio e investimentos. Entre 2000 e 2010, o continente cresceu a uma taxa anual de 4,8%, superando a média global de 3,1%. Entretanto, entre 2011 e 2020, a desaceleração econômica reduziu esse ritmo, embora os países africanos tenham mantido taxas de crescimento superiores à média mundial.