“Nos passos de Jelili”, um depoimento sobre a performance do artista Jelili Atiku

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Performance Jelili - Luke Garcia
Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro – Foto de Luke Garcia

Por Elizah Rodrigues, Por dentro da África

Foi doloridamente lindo. O artista nigeriano Jelili Atiku* é de uma força e de uma poesia que são como um soco do bem na boca do estômago. Ainda estou processando…

Performance de Jelili - Foto de Luke Garcia
Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro – Foto de Luke Garcia

Para mim, o mais incrível foram os comentários das pessoas na rua, em um trajeto da Praça 15 ao Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro. Um ambulante falou “vocês não vão ajudar o cara?”, outra mulher, vendedora de picolé: “ele fala?” e um senhor com um case de violão pendurado no ombro repetia “ninguém sabe dessa história, é bom falar, sobre os negros escravizados” (ele parecia ser um artista que se apresenta na rua), um outro senhor, mais velho, chega de bicicleta e fica parado em tom solene. Ele era muito parecido com o Jelili, mais velho, com um bonezinho daqueles tipo yourubá, na cabeça.

Performance de Jelili - Foto de Luke Garcia
Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro – Foto de Luke Garcia

Tudo tão ‘ontemagora’, tão ‘agoraontem’ e naquele lugar, vendo o porto. Ele foi jogando água e exorcizou a estátua do Dom João VI montado a cavalo, que tem na praça. Na frente da Candelária, Jelili se vira para a igreja e abre os braços, joga a água toda, muita, e um arco-íris aponta num canto e os sinos começam a soar! E ele sacode os espelhos da cabeça em resposta. Durante esta etapa, pingou uma chuva delicada. Em postagem  no facebook,  Jelili havia dedicado a performance aos meninos vítimas do massacre da Candelária*.

Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro
Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro – Foto de Luke Garcia

No trajeto, Jelili parava e soltava um gemido, pelo esforço. Na entrada do CCBB, as crianças foram as primeiras a terem a iniciativa de ajudar, à despeito de alguns adultos alertarem que não era para mexer em nada.

Performance Jelili
Performance de Jelili Atiku no Rio de Janeiro – Foto de Luke Garcia

Aí todos começaram a ajudar porque ele tentava entrar e a porta de vidro fechava, e ele tentava e a porta fechava. Aí todo mundo foi ajudando e ele foi subindo as escadas do CCBB até o local onde estava a instalação e finalizou lá. Nesta fase só os que estavam mais perto e com as câmaras conseguiram entrar. Mas foi chocante, tudo! 

*Condecorado pelo prêmio Prince Claus Award, concedido pelo governo da Holanda, o artista Jelili Atiku tem sua carreira marcada por performances provocativas, que toca em temas como desigualdade social, violência e radicalismo religioso, assuntos que fazem parte da região onde nasceu e cresceu, Lagos, capital da Nigéria. Jelili tem a sua obra exposta no Ex Africa, mostra que ficará até o dia 26 de março no CCBB do Rio de Janeiro. 

*Massacre da Candelária – Chacina que ocorreu na noite de 23 de julho de 1993, próximo à Igreja da Candelária, localizada no centro da cidade do Rio de Janeiro. Neste crime, oito jovens (seis menores e dois maiores de idade) em situação de rua foram assassinados.