Natalia da Luz, Por dentro da África
Artigo publicado em 2013 e atualizado em 2015
Rio – Localizada na Costa Ocidental da África e banhada pelo Oceano Atlântico, a Guiné-Bissau foi a primeira colônia portuguesa na África a ter reconhecida a sua independência. Há 42 anos, em 24 de setembro de 1973, uma nova trajetória começava a ser construída para o país que está às vésperas das eleições.
– Este dia é um marco na história do meu país. Felizmente, com esta data, passamos a ser os donos do nosso próprio nariz, deixamos de ser escravos dentro do nosso território – disse ao Por dentro da África, o guineense Mamadu Baldé, que nasceu em Gabú-Sara e cruzou o Oceano Atlântico em 2009 para estudar letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Na semana de comemorações da independência da Guiné-Bissau, de lembranças do líder da libertação Amílcar Cabral e de muita reflexão, Mamadu destaca que o reconhecimento da antiga colônia ocorreu apenas um ano após a declaração de independência, em 10 de setembro de 1974.
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Nesse período, acontecia na antiga metrópole, a Revolução dos Cravos, um momento da história posterior ao golpe de Estado, de 25 de abril de 1974, que depôs o regime ditatorial do Estado Novo, vigente desde 1933. A derrubada de Marcelo Caetano, sucessor de Antonio Salazar, representava o fim da ditadura.
Em quase todas as colônias portuguesas africanas – Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde – surgiam movimentos separatistas, que resultariam, em grande parte, nas guerrilhas armadas.
Relembrando a história
Na Guiné-Bissau, antes da chegada dos portugueses e até o século XVII, grande parte do território integrava o reino de Gabu, que se tornou independente após o declínio do Império Mali (1230 – 1600). Além do Mali e da Guiné Bissau, o Império também envolvia o Senegal, Guiné, Burkina Faso e Gâmbia.
A colonização teve início em 1558, com a fundação da Vila de Cacheu. A princípio, somente as margens dos rios e o litoral foram exploradas. Mais tarde, no século XIX, os colonizadores partiram para o interior.
A Vila de Bissau foi fundada em 1697, como base militar. Posteriormente elevada à cidade, tornou-se a capital colonial, estatuto que manteve após a independência de Portugal.
Amílcar Cabral
Estudante de Arquitetura e Urbanismo, também da UFRJ, o guineense Delmar Lopes, há um ano no Brasil, recorda a importância de Amílcar Cabral para a libertação do seu país. Ele conta que, em 1956, Amílcar (que estava no exílio na Guiné Conacri) e mais cinco correligionários fundaram o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
O PAIGC iniciou a luta armada de guerrilha e consolidou o domínio do território em 1973. No mesmo ano, Amílcar Cabral foi assassinado em Conacri, tendo sido substituído pelo irmão Luís de Almeida Cabral.
– O nosso povo tem a esperança de que um dia tudo mudará para melhor, e Amílcar sempre estará no nosso coração… Vamos continuar a cantar Guiné-Bissau e (para nós que estamos longe dela) a chorar por ela, lembrando e parabenizando os nossos valentes combatentes que se sacrificaram para que hoje sejamos livres… Viva Amílcar Cabral, o nosso patriota! – comemorou o guineense nascido em Bafatá.
Educação para o futuro
Para Delmar e Mamadu, representantes da juventude guineense, a educação é o passaporte para um futuro mais próspero no país onde nasceram e para onde pretendem retornar após o término do intercâmbio.
Com cerca de 1,6 milhão de habitantes, a Guiné-Bissau possui cerca de 45% da população muçulmana e falantes de português, fula e mandinga. A taxa de analfabetismo que, em 1974, era de 95% foi reduzida para 51%, de acordo com o governo.
Apesar do avanço, ainda é preciso mais, muito mais para melhorar o cenário que coloca o país na 176ª posição (dentre 186 nações) no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), segundo as Nações Unidas.
O Ministério da Educação da Guiné-Bissau, defendeu, em 2010, um desafio nacional: acabar até 2015 com o analfabetismo no país, que atinge quase metade da população, sobretudo as mulheres.
– Acredito que a prioridade e a maior dificuldade para o nosso desenvolvimento está na educação, nos estudos. É nela que os homens se tornam verdadeiros seres humanos – destacou Mamadu, que também trabalha como professor de inglês.
Eleições
Em 12 de Abril de 2012, uma ação militar comandada por militares guineenses atacaram a residência do ex-primeiro-ministro e candidato presidencial, Carlos Gomes Júnior, presidente do PAIGC. O grupo ocupou pontos estratégicos da capital Bissau, alegando defender as Forças Armadas de uma agressão de militares angolanos, que, segundo o Comando Militar, teria sido autorizada pelos chefes do Estado interino e do Governo.
Em 11 de maio do mesmo ano, Manuel Serifo Nhamadjo, presidente da Assembleia Nacional, assumiu o cargo de presidente Interino do país, com mandato para um ano.
O representante da Organização das Nações Unidas (ONU) na Guiné-Bissau, José Ramos-Horta, apelou para uma mudança de comportamento das forças de segurança e militares, no sentido de que haja “paz duradoura” no país. No dia 23 de junho de 2014, José Mário Vaz tomou posse como o novo presidente da República da Guiné-Bissau. Nos últimos meses, o país vivencia uma crise política. Em agosto, o presidente anunciou a dissolução do executivo.
– Guiné Bissau está cansada de golpes, que acontecem há 30 anos. Desejo que esse presidente sirva à nação e não a si mesmo – desabafou Mamadu.
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