Carnaval 2015: Beija-Flor levará história e cultura da Guiné Equatorial para a Sapucaí

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Natalia da Luzcapa, Por dentro da África

Rio – Um país localizado no Golfo da Guiné foi escolhido como tema do samba-enredo da Beja-Flor deste ano. Com o enredo “Um griot conta a história: um olhar sobre a África e o despontar da Guiné Equatorial. Caminhemos sobre a trilha de nossa felicidade “, a escola campeã 12 vezes do carnaval carioca vai levar 3.700 componentes para homenagear o país africano.

– Vamos contar a história do país, começando pela floresta equatorial com a árvore símbolo do país: a ceiba (nome de um gênero de muitas espécies de árvores de grande porte encontradas em áreas tropicais), que faz parte do brasão. Teremos uma grande cascata e uma imensidão verde – disse, em entrevista ao Por dentro da África, o carnavalesco Fran Sérgio, que visitou o país três vezes.

MAPA 1Apesar do nome, a Guiné-Bissau (de colonização portuguesa) e a Guiné Conacri (de colonização francesa) estão bem distantes geograficamente da Guiné Equatorial.

Com fronteiras entre Gabão, São Tomé e Príncipe, Camarões e Nigéria e cerca de 700 mil habitantes, a Guiné Equatorial é o único país da África de língua oficial espanhola, mas foram os navegadores portugueses os primeiros europeus a explorarem o Golfo da Guiné, em 1471.

Em 2010, o presidente  Teodoro Obiang decretou que o português seria uma das línguas oficiais do país, ao lado do espanhol e do francês. Desta forma, a Guiné se juntou, no ano passado, aos oito países membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) com Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste).

Apesar de o IDH do país ser considerado médio, a Guiné Equatorial possui o maior PIB per capita do continente africano, por conta da exploração do petróleo, que vem crescendo nos últimos anos.

Riquezas da Guiné

Carro abre-alas – Natalia da Luz

A descrição do samba-enredo ressalta que a África está diante de um horizonte da reconstrução, respeitando a história daqueles que resistiram, observando a luta de quem um dia venceu a dor. A nova face da África se lança rumo ao progresso; o Golfo da Guiné é o berço da herança cultural deixada pelos medievais reinos tribais dos Benga, dos Bubi e pelos clãs Fang.

– A ideia de falar sobre o país surgiu quando a Beija-Flor recebeu um convite para ir à festa da independência, em 2013. Foi quando vimos a beleza do país, as ilhas, as praias, a grande floresta equatorial! O encontro de um povo muito alegre, colorido e que dança o balelê  (ritmo parecido com o samba) nos chamou atenção e nos inspirou para falar sobre o país – contou Fran.

O carnavalesco Fran Sérgio no Barracão da Beija-Flor – Foto: Natalia da Luz

As principais riquezas da Guiné Equatorial são a pesca e a agricultura, com produtos como o algodão, café e cana de açúcar, além do petróleo. Desde o fim do século XX, com a exportação de petróleo, a renda per capita vem aumentado, ainda que a riqueza se concentre nas mãos de uma minoria. A exportação do barril por habitante é similar à do Kuwait.

– Hoje, é um país que está se destacando no cenário africano e que está usando o petróleo para construir uma nação mais moderna. Um dos nossos carros, que fala sobre as riquezas da Guiné Equatorial, vai surpreender na Sapucaí! – disse Fran, apontando para o carro que ressalta as atividades econômicas do país como a agricultura e a exploração do petróleo.

A referência ao griot no samba-enredo 

No desfile da Beija-Flor, a terceira escola a desfilar na Sapucaí nesta segunda, o griot contará a história do país.  A palavra griot é uma denominação francesa dada pelo colonizador – em português, seria o equivalente a “criado”. Esses guardiães da tradição oral, dos mitos e lendas africanas estão presentes entre muitos povos como os Mandinka, Fula, Hausa, Songhai, Wolof, Mossi e Dgomba, espalhados, principalmente, pela África Ocidental.

Imagem: Tall Papa Ibra

Eles são os porta-vozes da história e cultura de regiões onde as palavras contadas criam os valores e a identidade de um povo. Respeitados pelas sociedades africanas, os  griots mantêm vivos os costumes de uma época onde as memórias auditiva e visual eram os únicos recursos de que dispunham para a transmissão do conhecimento. Apesar dos avanços da escrita e da tecnologia, o papel deles não ficou obsoleto, permanece vivo.

– O griot entra na avenida representando o sábio africano, contando a história do samba-enredo. Haverá uma encenação dessa energia e referência de respeito pelos ancestrais – lembra o carnavalesco.

Saiba mais: “Somos mediadores da sociedade e utilizamos a palavra como o principal instrumento”, diz griot

Beija-flor e África 

Ensaio técnico da Beija-Flor – Foto: Divulgação

A Beija-Flor foi formada por um bloco carnavalesco no dia 25 de dezembro de 1948, mas apenas em 1953 se tornou oficialmente uma escola de samba. Desde então, o continente africano e a história dos negros no Brasil sempre foram abordados.

Em 2007, Áfricas: Do Berço Real à Corte Brasiliana deu título de vencedor do carnaval carioca à escola. Neste ano, com a África novamente na avenida, a expectativa é grande.

– A África é um continente com muitos elementos, muitas histórias, muita riqueza. É uma inspiração para o nosso carnaval.

Aprenda a letra do samba-enredo 

UM GRIÔ CONTA A HISTÓRIA: UM OLHAR SOBRE A
ÁFRICA E O DESPONTAR DA GUINÉ EQUATORIAL.
CAMINHEMOS SOBRE A TRILHA DE NOSSA FELICIDADE”

Enssaio técnico – Divulgação

Autores: J.Velloso, Samir Trindade, Jr Beija-Flor, Marquinhos Beija-Flor, Gilberto Oliveira, Elson Ramires, Dílson Marimba e Silvio Romai
Participação Especial: Ribeirinho e Junior Trindade
Intérprete: Neguinho da Beija-Flor

Vem na batida do tambor
Voltar na memória de um griô
Fala cansada, mãos calejadas
Ouça menino Beija-Flor
Ceiba, árvore da vida
Raízes na verde imensidão
Na crença de tribos antigas
Força incorporada nesse chão
O invasor singrou o mar, partiu em busca de riquezas
E encontrou nesse lugar
Novas Índias, outras realezas
Destino trocado, tratado se faz
Marejam os olhos dos ancestrais

Barracão da Beija-Flor – Foto: Natalia da Luz

Nego canta, nego clama liberdade
Sinfonia das marés, saudade
Um africano rei que não perdeu a fé
Era meu irmão, filho da Guiné

Formosa, divina ilha testemunha dos grilhões
Eu vi a escravidão erguer nações
Mas a negritude se congraça
A chama da igualdade não se apaga
Olha a morena na roda e vem sambar
Na ginga do balelé, cores no ar
Dessa mistura vem o meu axé, canta Brasil, dança Guiné
Criança, levanta a cabeça e vai embora
O mar que trouxe a dor riqueza aflora
Tem uma família agora
Quem beija essa flor não chora

Sou negro na raça, no sangue e na cor
Um guerreiro Beija-Flor
Oh, minha deusa soberana
Resgata sua alma africana