África em Verso: “Exaltação à grande mãe em 25 de maio”

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Imagem de African Union
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Elisabete Nascimento, Por dentro da África 

Movimento I

Hoje e todos os dias, são dias memoráveis à Grande Mãe.
Sua linhagem foi trocada por um nome de Batismo, no Cais de Angola.
Seu corpo sequestrado às margens do rio Kwanza,
Esquartejado em Berlim e distribuído como mercadoria, no Cais do Valongo:
Teu cabelo, livre e feliz, jogaram no lixo sob a pecha de daninho.
Teu rosto igualado aos símios e bugios.
Tua boca calada por força da máscara de flandres.
Teus seios sugados, sem limites, para o aleitamento dos miúdos da casa grande.
Tuas mãos esfoladas para a lida sem trégua.
Teus joelhos dobrados em face à chibata.
E teu útero, amasiado, violentado, sem direito à intimidade.
Teus pés surrupiados são os pilares da riqueza alheia.
Em troca, um corpo inteiro, somente para a pobreza e cárceres.
Eu só quero é ser feliz ao não esquecer.

Imagem da organização Our Africa
Imagem da organização Our Africa

Movimento II

Arrancaram os teus pimpolhos do berço
E os lançaram ao mar. Mas quanto deste sal
É o suor da servidão, flagelo imposto, tranquilamente, pelo Capitão-mor em sua Nau?
Disse o filósofo: a escória abaixo do Saara não tem história
E nem língua-mãe. São só grunhidos.
Mas por obra de restauração, eu e minhas irmãs trançamos urdiduras: Memórias.
E o Atlântico negro, entre mim e Mamãe, como águas de feto e afeto,
Faz brotar e protege minha poesia úmida-unguento
Testemunhando outras pequenas Áfricas,
Como tua herdeira, a Mátria brasileira.
Toda ela forjada de violências, repleta de incontáveis fragmentos de teu corpo,
Como São João de Meriti, igualmente, estropiada em Sesmarias.
Sem direito aos próprios rebentos, eis o corpo feminino
Obrigado a emprenhar, à exaustão, outros corpos estilhaçados.
E seus bebês, tal como mamãe, retintos, sujeitados à vala ou à solitária.
Sem direito à escola, restam-lhes cheirar cola
debaixo dos buritizais e Laranjais que já não há
Ou aprender, a duras penas, a empinar pipa e a ler a nossa Poética.
Inventaram, pois, seus algozes, as leis de proteção de seus desatinos.
Aos ouvidos viciados que, por ventura, minha lírica incomodar,
Lembrem-se dos milênios exaltados, nas canções de gesta,
aos heróis de uma épica de roedura.
Eu só quero é ser Feliz, ao Comemorar.

Imagem da União Africana
Imagem da União Africana

Movimento III

Minha Mãe é Matriarca de todas as Mães
E, por herança da rapina, rejeitada: Quem quer no Unido Reino da Bavária e em Ipanema
Ser filho ou filha da Mãe, pelos déspotas, esquartejada?
Mas eu te amo, Mãe, e todos os teus estilhaços são seres meus:
versículos de amorosidade.
Olhando bem teu corpo, me reconheço de Corpo e Alma,
E te saúdo numa roda de muitos Eus em nome de tua Gestação, em mim.
Estes Versos Gestatórios tecem-me tua parideira, com Esperança e Labor
Diante dos horrores das minas terrestres encovadas sob a Casa Africana.
Recebe este Poema-Umbilika como um Salmo, a liga de nossa Alegria.

Ouça (abaixo) o poema na voz de Elisabete Nascimento 

*Dia da África
O Dia da África foi criado em homenagem à fundação da Organização de Unidade Africana (hoje União Africana), em 25 de maio de 1963. Em 1972, a ONU instituiu a data de 25 de maio como o Dia da África.