Ebola na Guiné-Conacri: Diretor da Médicos Sem Fronteiras fala sobre epidemia no país

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A nurse at the MSF isolation ward in Kampungu comforts a patient who has been diagnosed to have the Ebola virus. Photo: WHO/Chris Black
A nurse at the MSF isolation ward in Kampungu comforts a patient who has been diagnosed to have the Ebola virus. Photo: WHO/Chris Black

Natalia da Luz, Por dentro da África

Rio – Uma doença rara com alto grau de letalidade assusta a população da Guiné-Conacri e coloca as organizações de saúde em alerta para contê-la.  Segundo a organização Médicos Sem Fronteiras, o ebola provocou, até segunda-feira,  a morte de 60 pessoas, dentre os 80 casos registrados.

– Confirmamos a epidemia do vírus em uma área onde nunca havíamos visto. Até agora, registramos casos em três cidades e em algumas vilas. Apesar do número de mortes, a epidemia não está fora de controle. Estamos tentando atrair todas as pessoas para as unidades de tratamento – disse, em entrevista exclusiva ao Por dentro da África, Bart Janssens, diretor de operações da Médicos Sem Fronteiras.

Com cerca de 12 milhões de habitantes, a Guiné, também chamada Guiné-Conacri, é um país da África Ocidental limitado a norte pela Guiné-Bissau e pelo Senegal, a norte e leste pelo Mali, a leste pela Costa do Marfim, a sul pela Libéria e pela Serra Leoa e a oeste pelo oceano Atlântico. Esta é a primeira vez que o país entra na rota da doença encontrada anteriormente no Sudão do Sul, Congo Brazaville, República Democrática do Congo, Gabão e Uganda.

GUINE MAPA

Apesar da suspeita de casos no país vizinho Serra Leoa, o especialista disse que ainda não há confirmação oficial. Ele acha possível que o vírus avance para as regiões fronteiriças, mas é preciso aguardar as amostras que estão em laboratórios. Ele afirmou que as equipes de saúde estão trabalhando para conter a epidemia, degrau por degrau. Para ele, não há razão para acreditar que esse vírus na Guiné-Conacri é mais forte do que as versões encontradas em epidemias anteriores.

– Há algumas subcategorias de ebola. E não há razão para acreditar que esse surto seja diferente daqueles que já acompanhamos anteriormente. É difícil comparar esse caso com as epidemias do passado, mas sabemos que ele está se desenvolvendo em ambiente parecido – detalhou o especialista, que trabalhou em campo durante crises de saúde pública pela MSF, de 1995 a 2006 e pela Cruz Vermelha, de 2006 a 2009.

De acordo com a ONU, há, pelo menos, cinco subtipos de vírus ebola: Ebola-Zaire (encontrado no Zaire, em 1976), Ebola-Sudan (encontrado no Sudão do Sul, em 1976), Ebola-Ivory Coast (encontrado na Costa do Marfim, em 1994), Ebola-Bundibugyo (encontrado em Uganda), e Ebola-Reston (encontrado em macacos importados para os Estados Unidos a partir do Filipinas em 1989).

Histórico do Ebola 

Foto do primeiro surto de Ebola, em 1976 - Wikipedia
Foto do primeiro surto de Ebola, em 1976 – Wikipedia

Apesar de não ser uma doença nova, ela continua sendo um mistério, com poucos avanços no caminho para a descoberta da cura. Ela foi identificada pela primeira vez em 1976 no antigo Zaire (atual República Democrática do Congo), perto do rio Ébola, que acabou servindo de nome para o vírus.

A descoberta foi feita pela equipe de Guido van Der Groen, chefe do laboratório de Microbiologia do Instituto de Medicina Tropical de Antuérpia, na Bélgica. Desde então, diferentes estirpes do ebola causaram epidemias com 50 a 90% de mortalidade em Uganda, Sudão do Sul, Gabão, República Democrática do Congo e Congo Brazaville.

A segunda epidemia ocorreu em 1979, quando 80% das vítimas morreram. Em maio de 1995, a cidade de Mesengo, a 150 quilômetros de Kikwit, na República Democrática do Congo, foi atingida pelo vírus, que matou mais de cem pessoas.

– Ainda não há cura, vacinas… Nada de novo e revolucionário nos últimos anos. O ebola é uma doença que continua muito rara e encontrada próxima às áreas de natureza selvagem. Apesar do alto grau de letalidade, tivemos poucas epidemias nos últimos anos – disse Bart.

RDC mapa
Região com maior concentração dos surtos

De acordo com a OMS, ao todo, os casos identificados desde 1976 (com exceção do surto na Guiné) são de 2300, dos quais cerca de 1500 resultaram em morte. Seguindo a cronologia da OMS (de 1976 até 2011), é possível constatar uma variação de 25% a 100% em relação ao número de mortos pela doença. O maior número de mortes foi em 1976, na República Democrática do Congo (com 280 casos fatais), seguido do ano de 1995, também no mesmo país (com 254 casos fatais). Os países com o maior número de surtos são: República Democrática do Congo (5), Congo Brazaville (4) e Gabão (4).

De acordo com pesquisa das Nações Unidas, estudos ecológicos extensivos estão em andamento na Costa do Marfim, Gabão e Zaire, mas ainda sem uma resposta concreta para o combate ao ebola. A doença, altamente contagiosa e registrada apenas na África, é transmitida entre humanos através do contato com sangue, secreções ou fluidos corporais. O vírus, literalmente, dissolve os órgãos internos dos doentes, que perdem sangue e, muitas vezes, morrem de parada cardíaca.

Sintomas 

360px-Ebola_Pathenogensis_pathOs sintomas do ebola são: febre alta, calafrios, dor de cabeça, náusea, dor abdominal, dor de garganta e prostração profunda. Em alguns casos, entre o quinto e o sétimo dia, há manifestações hemorrágicas. Nas epidemias observadas, todos os casos com forma hemorrágica evoluíram para morte.

A taxa de mortalidade da doença depende da estirpe do vírus e do estado de saúde das populações afetadas. Em geral, o ebola mata suas vítimas em poucos dias, podendo levar até 9 dias, e a mortalidade, como mencionado anteriormente, pode variar de 50% a 90%.

Força-tarefa na Guiné 

A organização internacional Médicos Sem Fronteiras vem reforçando a sua equipe na região. No total, segundo Bart, 35 médicos trabalharão para conter o surto o mais rápido possível.  Ainda estão sendo enviadas 33 toneladas de material, entre medicamentos e equipamentos, para os centros de isolamento.

– O atendimento aos pacientes é focado no tratamento dos sintomas: fazemos a reidratação, uso de analgésicos e antibióticos. Mais da metade dos pacientes que contraem o vírus, normalmente, morrem em poucas semanas. É uma infecção muito rápida…

Conselho para a população

UN - EBOLA
Preparação dos médicos para cuidar dos pacientes – Foto: ONU

– Nesse momento, estamos dando muitas informações para a população. Falamos para as pessoas irem rapidamente para os hospitais e unidades de tratamento, assim que sentirem os sintomas. Também falamos tomarem cuidado com os infectados… Em rituais de funeral, por exemplo, elas não devem tocar no corpo porque os corpos estão contaminados – ressaltou o especialista.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, mensagens de saúde pública para redução de riscos devem se concentrar em vários fatores como o alerta para a transmissão da doença a partir do contato (com a carne ou o sangue) de morcegos frutívoros ou macacos infectados. Comunidades afetadas pelo Ebola também devem tomar medidas de contenção como o enterro do infectado. Pessoas que morreram contaminadas pelo ebola devem ser prontamente enterradas.

Por dentro da África