
Os ataques recentes de grupos armados no norte de Moçambique forçaram dezenas de milhares de pessoas a fugir apenas no mês de julho, agravando a já crítica crise humanitária na província de Cabo Delgado e sobrecarregando os limitados recursos de ajuda disponíveis.
O deslocamento é mais uma consequência de um conjunto de emergências sobrepostas no país — incluindo violência armada, choques climáticos, surtos de doenças e um grave déficit de financiamento. Desde janeiro, mais de 95 mil pessoas foram forçadas a deixar suas casas devido à insegurança, enquanto o acesso humanitário torna-se cada vez mais frágil.
De acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), os ataques ocorridos entre 20 e 28 de julho deslocaram pelo menos 46.667 pessoas nos distritos de Chiúre, Ancuabe e Muidumbe. O distrito de Chiúre foi o mais afetado, com mais de 42 mil pessoas forçadas a abandonar suas casas — mais da metade delas crianças.
“A insegurança persiste, e muitas das pessoas em movimento não possuem documentação civil”, alertou o OCHA em boletim humanitário divulgado no sábado. “Esses fatores podem impactar negativamente a mobilidade, o acesso seguro a serviços básicos e a capacidade de manter meios de subsistência.”
Crianças separadas das famílias
Os ataques em localidades como Chiúre Velho, Ocua e Mazeze levaram inúmeras famílias a buscar abrigo em Chiúre Sede, onde vivem agora em condições precárias e superlotadas nos bairros Micone e Namicir. Há relatos de um elevado número de crianças desacompanhadas ou separadas de suas famílias.
A situação de segurança também se deteriorou rapidamente no distrito de Ancuabe. Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), o número de famílias deslocadas quase triplicou em apenas uma semana, chegando a 444 lares (1.946 pessoas) — incluindo mais de 1.200 crianças. A violência obrigou os moradores da vila de Nanduli a se refugiarem em Chiote e Ancuabe Sede.
Em Muidumbe, combatentes incendiaram casas na vila de Magaia e abriram fogo nas imediações de Mungue, forçando cerca de 500 famílias a fugirem para locais de deslocamento próximos, onde o acesso humanitário segue limitado.
Riscos de proteção e falta de financiamento
O OCHA enfatizou que, de acordo com o direito internacional, civis devem ter o direito de buscar segurança e escolher livremente seu destino. No entanto, a insegurança, a falta de documentos e realocações involuntárias aumentam os riscos de proteção. Ao mesmo tempo, a resposta humanitária está gravemente subfinanciada.
Até julho, apenas 19% do Plano de Resposta Humanitária de Moçambique para 2025 havia sido financiado. Dos US$ 352 milhões solicitados, apenas US$ 66 milhões foram recebidos — o que forçou as agências humanitárias a reduzir suas metas de atendimento em mais de 70%. Em vez de alcançar 1,1 milhão de pessoas, agora planejam ajudar apenas 317 mil.
“Financiamento urgente e contínuo é essencial para evitar o agravamento da situação e responder às crescentes necessidades humanitárias, que continuam tão agudas e disseminadas como sempre”, alertou o relatório do OCHA.