Gerson Brandão, Por dentro da África
Adis Abeba – O ano de 2020 está sendo um ano particularmente difícil para a Etiópia. Atividades econômicas paralisadas, restrições de movimento, incluindo o fechamento de fronteiras que, muitas vezes, impede a chegada bens essenciais são alguns dos impactos negativos na economia do país causados pela Covid-19. Porém a chegada e as celebrações do Ano Novo Etíope (que começa em 11 de setembro) renova as esperanças de que o “amanhã” será melhor. Apesar das restrições impostas pela pandemia há uma grande sensação de alegria e mais movimento nas ruas da capital, Adis Abeba, tanto quanto em outras regiões do país.
A pandemia também ameaça os avanços obtidos no controle e tratamento a outras ameaças à saúde da população local como tuberculose, HIV/AIDS e malária, pois os postos médicos têm tido dificuldades para gerir várias prioridades ao mesmo tempo. Neste momento também há um surto de cólera em, pelo menos, 17 zonas em três das 10 regiões da Etiópia.
Além dos desafios descritos na área da saúde, neste ano, o país ainda se defronta
contra o impacto da seca em algumas regiões ao mesmo tempo em que as maiores
inundações dos últimos 60 anos vêm castigando o norte e o leste do país. Existem
ainda disputas de fronteiras regionais, conflitos intercomunais, crescente tensão étnica
e infestação de gafanhotos, que resultou em uma crise humanitária complexa na Etiópia, em 2020.
Esse cenário compõe o feriado que marca o primeiro dia no calendário etíope, o Enkutatash. Conhecido em amárico, a língua oficial da Etiópia, como Enkutatash, a festa do ano novo, é uma sequência de celebrações que duram uma semana e são focadas em eventos familiares. Tradicionalmente, toda a família deve participar de uma série de eventos, incluindo o abate de um animal: uma ovelha, cabra ou vaca; dependendo da condição financeira da família. O feriado começa na véspera de Ano Novo, neste ano, no dia 10 de setembro.
Reza a tradição também que cada família deve acender uma tocha que simboliza a chegada da nova estação do sol, encerrando a estação das chuvas que começou em junho.
A Etiópia usa um calendário único, que conta o ano sete anos e oito meses atrás do
calendário gregoriano usado na maior parte do mundo. Enkutatash significa “presente de joias”, um nome que se relaciona com a história da viagem da Rainha de Sabá à Terra Santa.
De acordo com a Bíblia e outros textos antigos, a antiga rainha da Etiópia viajou a Jerusalém para se encontrar com o Rei Salomão, onde a Rainha presenteou o Rei com uma grande quantidade de ouro e pedras preciosas. Após o seu retorno a Etiópia, os governantes locais saudaram a Rainha de forma semelhante com inúmeras joias comemorando o retorno e um novo ciclo.
Como esta época do ano coincide com o final da estação das chuvas, a paisagem é
coberta por flores amarelas brilhantes, quase como a primavera, mas também em
comemoração à colheita de grãos que deveria ser feita.
A combinação (e recorrência), de problemas simultâneos, como inundações, infestação de gafanhotos do deserto, bem como secas esporádicas, provavelmente afetarão a colheita e atividades pastorais na Etiópia. No entanto, apesar das adversidades enfrentadas pela população local, há uma esperança crescente de que esta fase vai passar, assim sendo, as flores amarelas e brilhantes do novo ano darão um novo sentido à vida do país.