Tabanka de Salineiro: Um ritual de Cabo Verde

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Tabanka - Foto: Nuno Rebocho
Tabanka – Foto: Nuno Rebocho

Por Nuno Rebocho, Por dentro da África 

Santiago, Cabo Verde – A tabanka – espécie de “irmandade” ou associação de socorros mútuos com objetivos diversos, como sejam a organização de funerais, batizados, etc. 1 (nas palavras de P. Cardoso) – terá surgido em Cabo Vede, nas zonas rurais da ilha de Santiago, por volta do século séc. XVI (segundo alguns estudiosos), mas só no séc. XVIII aparece alguma documentação sobre ela. Constitui uma tradição genuína de Cabo Verde, embora reflita um processo que se desenvolveu também noutras paragens que receberam formas de crioulização – casos de Angola, Brasil, S. Tomé.

A escassez documental sobre ela existente entende-se, muito embora tenha chegado a ser proposta a sua candidatura a Património Imaterial da Humanidade: sendo uma manifestação cultural dos mais desfavorecidos da sociedade (entre eles, naturalmente, os escravos) – e por isso pouco letrados ou mesmo iletrados -, para mais hostilizada tanto pela administração colonial como pela Igreja Católica (altamente dominante), a quase absoluta falta de documentos é também uma arma defensiva dos seus praticantes. De facto, a tabanka – segundo Eutrópio Lima da Cruz – “trata-se essencialmente duma procissão dançada […] que mobiliza uma vila inteira ou grupo de pessoas unidas para a vida e para a morte […] Esta manifestação coletiva insere o indivíduo num sentimento de solidariedade que confere à procissão uma certa importância e lhe dá uma aparência de organização, magnitude, ritmo e esforço coletivo embora continue sendo um divertimento”.

A palavra tabanca é proveniente da Guiné-Bissau, de cuja zona dos abundantes rios eram provenientes as primeiras levas de escravos. Originalmente (pelo menos nessa data, séc. XVI, surge o termo em textos portugueses) designaria, em língua temne 2, os baluartes edificados na costa pelos navegadores portugueses. Acabou por se reportar aos aldeamentos guineenses e por essa via entrar no crioulo, reportando-se às festividades dos escravos nos aldeamentos que foram aos poucos aparecendo.

Imagem da tabanka

Segundo José Maria Semedo e Maria R. Turano, o fenómeno da tabanka no séc. XVIII remonta a um 3 de maio (dia de Santa Cruz dos escravos – daí que grande número de tabankas atualmente existentes a tenham como bandeira), quando os proprietários, senhores de escravos (morgados), imbuídos de espírito cristão, deram, por um dia, a liberdade aos escravos e estes aproveitaram o facto para fazer, em jeito de justificada rebeldia (de acordo com a resistência à situação em que eram colocados), os seus festejos realizando um teatro de rua onde ridicularizavam a estrutura social então em vigor e que logicamente os subjugava, misturando nele aspetos religiosos cristãos com práticas de origem africana. Este período de festa prolongava-se por norma até ao S. João, pelo que S. João Batista é igualmente uma das figuras presentes nas tabankas (é o caso da de Achada Grande, na Praia). E o dia de festa alongou-se por todo um período, desde os princípios de maio até aos princípios de julho.

Como se refere em “Igreja, Missionação e Socialização” (Maria Emília Madeira dos Santos e Maria João Soares, “História Geral de Cabo Verde”, IIPC)

“a interpenetração da religião católica e das religiões africanas nas suas manifestações públicas terá proporcionado o franqueamento de barreiras por circunstâncias que passavam despercebidas aos próprios atores católicos e “gentios”. Trata-se de um fenómeno natural: o solstício do verão. Os rituais religiosos dos povos do hemisfério norte são marcados pelo mesmo sentido cósmico e coincidentes, porque se regem pelo tempo astral.

“Assim, o dia de S. João, data do pagamento das rendas rurais e de todos os contratos, representa o dia-a-dia das festividades dos santos populares, já assimiladas na Europa às festas das colheitas durante o mês de junho e acolhidas na tabanka cabo-verdiana”.

O rei de uma tabanka

Tabanka - Foto: Nuno Rebocho
Tabanka – Foto: Nuno Rebocho

Assim, a tabanka foi-se desenvolvendo como um desfile público em que cada interveniente representa um elemento da sociedade. Ela foi, na origem, um ritual emergente nas zonas rurais desta ilha (extensivo depois à ilha do Maio) e identifica-se de certo modo com rituais de outras ilhas – como o colá son jon, típico da ilha de Santo Antão, ou as bandeiras da ilha do Fogo. Os senhores de escravos, crioulizados e menos sujeitos às apertadas e ossificadas normas da sociedade reinol, eram por isso mais próximos aos seus dependentes e mais disponibilizadas para estas “liberalidades”.

Por outro lado, nestas zonas rurais, o clero 4 – também crioulizado, sobretudo em consequência das reformas do bispo de Santiago D. Francisco da Cruz – mais com esses rituais se identificava, por que subjaziam à sua origem, e estavam mais predispostos a permitir as práticas onde despontava algo das crenças dos escravos. Estes, por seu turno, convertidos ao catolicismo, procuravam aproximar os seus atos da Igreja Católica (sempre presente nas suas vidas, desde a conversão, forçada ou não), pelo que construíam as suas próprias capelas – que eram o natural centro dos festejos que celebravam. Este processo de aproximação <-> repulsa do catolicismo versus as práticas de raiz animista marcou as festas da tabanka (até aos nossos dias), o que de certo modo transparece também na sua música.

Embora hostilizada pela Administração portuguesa (que receava a eventualidade de insurreição dos escravos) e pela Igreja Católica, que nela via reminiscências animistas, a primeira legislação proibindo a tabanka apenas surgiu em fins do séc. XIX: com tal repressão se torna ela progressivamente uma manifestação clandestina, sendo mesmo proibida nos principais centros urbanos. Só depois da independência de Cabo Verde, graças a meia dúzia de investigadores e interessados, houve tentativas de ressurreição das manifestações culturais genuínas, ainda que se tenha verificado que, mercê da evolução dos costumes e de relativo aggiornamento cultural das jovens gerações, ela tenha aos poucos desaparecido, perdendo o brilho e o misticismo de outrora.

A tabanka de Salineiro será uma das mais antigas da Santiago, perdendo muitos dos seus elementos (o que a obriga, quando desfila, a incorporar participantes de outras tabankas) e algumas das suas caraterísticas originais. Entretanto, a de Porto Mosquito pura e simplesmente desapareceu, o que terá acontecido a muitas outras.

Cada tabanka ostenta uma bandeira com o santo a que está ligada, como acontece com as de Santa Cruz, a de S. João Batista, a de S. Jorge. É verdade que muitos elementos se perderam com o andar dos tempos, mas no fundamental que se vai encontrando ainda transparece essa convivência, mesmo que atualmente já raramente se veja a tabanka integral. O que fere as regras da verdadeira tabanka é o aparecimento de imagens de extração contemporânea (é o caso de imagens Che Guevara) – o que reflete uma intenção política por parte dos respetivos promitentes, identificados neste caso com o PAICV (é o caso da tabanka de Santa Cruz – confirmar).

Características da tabanka

A tabanka possui as suas figuras – um Rei da Corte, uma Rainha do Corte, um Rei do Campo, uma Rainha do Agasalho (do Gasadjo), o padre, os cativos, os forros, o médico, ladrões (entre eles o falcão e as francedjas), soldados, um juiz, o doido, nalguns casos também um enfermeiro, um professor, autoridades, damas da Rainha (fidjas di santu), diversos “figurões”, etc. Ou seja, procura reproduzir a sociedade envolvente em forma de paródia, que é um modo de a criticar e satirizar, assim a desmontando quando esta se mostrava uma má madrasta.

Como se observa na “História Geral de Cabo Verde”, “nas cerimónias eram integrados estandartes, cruzes, luzes de velas, azeite, tamboretes, búzios, água benta da igreja matriz, crucifixos e imagens santas, músicas, danças, cantochões e ladainhas, numa coexistência harmonizada dos círculos de convívio”. Havia portanto uma fusão de elementos integrantes do culto cristão-católico com artefactos que eram próprios da vivência animista que habitava a maioria dos participantes da tabanka.

À medida que os tempos foram reduzindo a tabanka aos seus elementos mais simples, afetando a sua complexidade, esta simplificou-se, perdendo-se alguns dos seus ritos, permanecendo embora o cortejo e o almoço. Ou seja, a tabanka foi-se depurando, embora importe sublinhar o que foi e, na medida do que for possível, recuperar algumas das suas etapas entretanto esquecidas.

Estrutura musical

Tabanka - Foto: Nuno Rebocho
Tabanka – Foto: Nuno Rebocho

No cortejo que marca a tabanka participam os tambureru (tocadores de tambor), os korneteru (tocadores de corneta, em geral feita de corno) e as kantaderas (cantadeiras) que animam o desfile ao longo de cada trajeto. Outros instrumentos musicais se foram incorporando nos cortejos, parte fundamental deste ritual, como os búzios (que nalguns casos substituem a corneta e noutros com ela coabitam), apitos, corneta de pistões (que substitui a corneta de chifre) e a cimboa ou cimbó (a de Salineiro – tanto quanto é conhecido – é a única que até recentemente o praticava). Como se verifica, são instrumentos musicais rudimentares os que se apresentam na tabanka, dando-lhe por essa forma um cunho que muito sugere os parcos recursos dos seus integrantes originais. 5

Na preparação dos almoços rituais, os cozinheiros eram acompanhados por grupos que tocavam batuku (que também era efetuado nos batizados) e davam ambiente ao cochir do milho para o pilão. Progressivamente, o batuku, executado num ritmo de tempo binário mas de divisão ternária, marcado pela percussão das tchabetas e palmas acompanhadas ou não pela cimboa monocórdica), às quais se juntam o canto e a dança foi-se automatizando da tabanka, mas inicialmente constituía apenas um dos momentos deste processo. Com as kantaderas (de preferência duas em despique entre si), as batukaderas formavam circularmente entre si, com as txabetas entre pernas dando o ritmo, as ancas das bailaderas saracoteando, com elas com panu ajudando o torno – genuinamente, o batuku é uma demonstração feminina, embora comecem agora a surgir grupos que incorporam homens. Depois, quase em clímax do canto, desabrochando em finaçom (final do som) mais rápido e mais agudo. 6

Segundo refere Margarida Brito (“Breves Apontamentos sobre as Formas Musicais existentes em Cabo Verde”), o ritmo da Tabanca é binário, executado por tambores, cornetins e búzios, estes geralmente em três registos diferentes (grave, médio e agudo) responsáveis pelo ostinato rítmico-melódico, cuja tessitura geralmente é de uma sexta.

Fases da tabanka

O cortejo da tabanka começava à porta de uma igreja (ou capela) – a que se chamava buska santu, buscar o santo -, percorrendo depois as ruas do centro urbano e integrando o santo a bandeira de cada tabanka (cumpra santu, comprar o santo). Como se observa, a tradição obriga cada tabanka a relacionar-se com a Igreja, contrariando as reservas (por vezes ostensivas) que esta lhes punha.

  • missa e cortejo

Três dias antes da festa, as noites são ocupadas com a feitura do pilão (cochir o milho sabugo), feito pelas mulheres e de modo a não perturbar as suas tarefas diárias – ás vezes, por isso, feito à noite, fora das horas normais de trabalho. Normalmente é acompanhada de batuku. São os preparativos para o grande repasto em comum, que se celebra no dia da missa e do buska santu, que dava propriamente início aos grandes festejos. Depois de realizada a missa no dia dedicado ao santo, este era roubado da capela da tabanka, iniciando-se então a sua procura teórica – buska santu.

Embora na realidade, tudo seja simulado e encenado, parte-se do princípio de que se ignora para onde o santo foi levado. Até à sua recuperação – cumpra santu (o que acontece sete dias depois) – devem celebrar-se salvas durante todas as noites na respetiva capela: com os mais velhos sentados em volta do altar cheio de velas e com dois rapazes, tambureros, colocados de cada lado do altar, tendo na mão uma vara. Segundo JM Semedo, há um ritual a cumprir: o Rei dando indicação ao público para se levantar, os tambureros fletindo a cabeça e levantando-se lentamente. O ritmo dos tambureros acelerava-se, enquanto mudavam as posições das varas.

Seguia-se o ritual do beijo das varas (beju vara), começado pelos homens que, dois a dois, se aproximavam do altar e depois de vénia mútua se ajoelhavam e beijavam as varas. Depois vinham as mulheres e, por último, indo sozinhos, é a vez das Rainhas e dos Reis. Um destes erguia as varas e beijava-as diante do santo. “O último a beijar é o Rei da Corte” (JM Semedo).

O Rei do Campo, que vai às casas, envia o falcão para que roube o santo à Rainha de Agasalho (Rainha de Gasadjo – assim chamada porque recebia o santo), que o espera à porta de sua casa com o Rei da Corte. Para o conseguir, o falcão dissimula-se entre falsos falcões (francedjas), a fim de ludibriar os soldados. O Rei do Campo vai fazendo perguntas ao Rei da Corte em tom mais ou menos jocoso e mostrando-lhe objetos, que o Rei da Corte vai negando. Até que, entre toque de búzios e rufar de tambores, acerta com a localização do santo. Então toma a respetiva vara. Cumpre-se assim o cumpra santu. Como se observa, esta parte da tabanka é muito semelhante à da bandeira, que não é mais – ao fim e ao cabo – do que a tabanka transplantada para as condições da ilha do Fogo.

Após a cerimónia do beju vara, os tambureru dançam em compasso rápido, após o que dão entrada os búzios. Cada toque de tambor corresponde a uma Avé-Maria (tal como as ladainhas, parte das ressas). No caso de, entretanto, falecer algum elemento da tabanka, reza-se a respetiva salva sete dias depois do enterro. No final desta cerimónia procede-se ao levantamento da esteira.

  • o ritual do repasto

O almoço ritual é um dos momentos altos da celebração da tabanka. Antes é preparado o pilão, cochinado o milho num instrumento onde este é colocado e esmagado. A preparação do repasto, tal como o repasto, é feita em clima de festa coletiva, acompanhado por um batuku. È a parte totalmente entregue aos cuidados das mulheres e tem uma grande identificação com as celebrações próprias da banderona – de resto, esta parte da tabanka leva a considerar a bandera como uma variante de tabanka transplantada para a vizinha ilha do Fogo.

Como preparativo da tabanka, prepara-se por norma uma caxupada, também sendo nalguns casos preparado o xerém ou o cuscus à maneira cabo-verdiana. Todavia, como acontece em Salineiro, também se apresenta um guisado de cabrito com mandioca ou canja de frango. Porém, ao contrário de Portugal, a canja não é uma refeição de cariz médico – uma aguadilha de galinha em caldo de arroz, de resto introduzido na culinária portuguesa como originária da antiga Índia portuguesa.

  • o cortejo

Hoje em dia, a celebração da tabanka está praticamente reduzida ao seu cortejo, que culminava os atos de cumpra santu (onde se obtinha a designação de quem no ano seguinte tinha o encargo de celebrar a festa e abrir capela – ritual mantido pela generalidade das bandera). Eram assim sete dias de folguedo depois que se procedia ao buska santu.

O desfile era iniciado pelos ladrões (encarregues de recuperarem o santo e indicarem a casa e o festeiro que no ano seguinte tem que realizar a festa; tinham também a tarefa de abrir caminho pelas ruas por onde o cortejo passa). Depois dos ladrões, seguem-se os cativos que eram para tanto “batizados”. E culmina com os forros que se integram no cortejo, E o falcão, a quem compete identificar e assinalar com uma bandeira a casa onde o santo está guardado, devendo então roubá-la e levá-la ao Rei de Campo, que integra o cortejo.

Como se observa, a tabanka – muito influenciada pelos ritos religiosos – conserva em si muitos elementos que integram a missa católica.

Tabankas existentes e organizações diversas

Algumas tabankas subsistem:

– Tabanka de Salineiro

– Tabanka da Várzea

– Tabanka de Achada Grande

– Tabanka da Achada de Santo António

– Tabanka de Santa Cruz

– Tabanka de Chã de Tanque

– Existe atualmente uma Associação Cabo Verdiana de Tabankas. Houve em Assomada um Museu Nacional da Tabanka, que foi substituído (numa má política) pelo Museu Norberto Tavares, ainda que este músico muito mereça ser invocado.

– Existem Casas da Tabanka, sobretudo em Chã de Tanque, que de algum modo lhe conservam a memória.

Bibliografia

  • História Geral de Cabo Verde, IIPC
  • Félix Monteiro – Tabanka, Evolução, in Claridade nº 6, junho de 1948
  • João Lopes – Apontamento, in Claridade, nº1, março de 1939
  • Margarida BritoBreves Apontamentos sobre as Formas Musicais existentes em Cabo Verde , 1998
  • P. Cardoso – Folclore Caboverdiano, 1933
  • José Maria Semedo e Maria R. Turano – Cabo Verde, o Ciclo Ritual das Festividades da Tabanca, Spleen, s/d
  • Nuno Rebocho – Irmandade dos Homens Pretos de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Ribeira Grande de Santiago

1 – Esta situação obriga a que se explore devidamente as pistas deixadas pela linguagem (oral ou escrita), significativas pegadas que indicam as diversas etapas da tabanka. Ajuda a perceber – sobretudo devido à falta de documentação, explicada sobretudo pelo facto dos seus elementos serem iletrados e a classe dominante a menosprezar – a evolução da tabanka e de algum modo traça muito do seu perfil, contribuindo para a perceção da sua história.

2 – O temne (também conhecido como ‘themne’ ou ‘timne’) é uma língua da subfamília atlântica falada em Serra Leoa por aproximadamente 2 milhões de falantes, ou seja, mais de 30% da população desse país. Trata-se de uma língua tonal, sendo uma das línguas mais faladas em Serra Leoa. O temne está relacionado às línguas baga, faladas na Guiné e ao sherbro falado em Serra Leoa. Também há temnes em diversos outros países da África Ocidental, como Guiné e Gâmbia.

3 – A tabanka foi, pois, uma forma embrionária de associação de socorros mútuos, talvez imitando outras associações porventura existentes – caso da Irmandade dos Homens Pretos -, procurando reproduzir (ou imitar) os modos de organização na sociedade que viam à sua volta, buscando generalizar os seus modelos e tentando levá-los às classes mais desprotegidas. A tabanka tem, pois, afinidades com a Irmandade dos Homens Pretos, podendo ser por esta influenciada.

4 – Morgados e baixo clero eram naturalmente mais suscetíveis de “contaminação” com as camadas sociais de que eram cotangentes. Neste aspeto, eram o ela mais fraco do rolo compressor/opressor da classe dominante e, por isso, mais sensíveis aos usos e costumes dos escravos deles dependentes.

5 – “O Batuque, de origem africana, que surge em Cabo Verde provavelmente só na ilh ade S. Tiago (existente também no Brasil, através da ida dos escravos, e nos Açores, na ilha de S. Miguel), é executado num ritmo de tempo binário mas de divisão ternária, marcado pela percussão das ‘tchabetas e palmas’ acompanhadas pela cimboa monocórdica, às quais se juntam o canto e a dança.

“Segundo Dulce Almada o Batuque é uma variante do ritmo de San Jon. Esta teoria tem a sua razão de ser na medida em que o Batuque, inicialmente de ritmo binário, (no Brasil este ritmo manteve-se) isto é, num compasso binário simples de dois por quatro, transformou-se no mesmo ritmo de San Jon que é o compasso composto de seis por oito, pois são compassos correspondentes, cada compasso simples corresponde a um compasso composto e vice-versa. No San Jon o andamento é mais acelerado e a poliritmia é mais complexa” (“Breves Apontamentos sobre as Formas Musicais existentes em Cabo Verde”, Margarida Brito).

6 – “O Finaçon é uma melopeia que consiste num encadeamento de provérbios ou assuntos do quotidiano, declamados, com inflexões vocais, no ritmo de batuque, quase sempre improvisados no momento e normalmente cantado por uma mulher. Esses improvisos podem arrastar-se durante horas”. (“Breves Apontamentos sobre as Formas Musicais existentes em Cabo Verde”, Margarida Brito).

Nuno Rebocho nasceu em Queluz (Portugal), mas passou a infância em Moçambique. Participou ativamente na luta contra o fascismo de Salazar, chegando a ser preso durante cinco anos, por motivos políticos. Hoje, vive em Ribeira Grande de Santiago (Cabo Verde) como jornalista, escritor e estudioso das representações culturais africanas.

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